Brasil e Canadá: parceiros cada vez mais próximos

Países intensificam contatos e planejam relação pós-covid-19

Por Sérgio Siscaro

Além de representar um grave desafio de saúde pública, a disseminação do novo coronavírus ao redor do mundo trouxe uma série de incertezas sobre como será o mundo pós-pandemia. Aspectos que vão desde a recuperação econômica dos países, passando pela reativação de seus negócios e a própria forma de interação entre as pessoas, com destaque para os canais de comunicação remota, têm sido questionados.

Antecipando-se a esse debate, Brasil e Canadá já discutem formas de intensificar suas relações bilaterais após a crise da Covid-19. A fim de viabilizar essas discussões, a Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CCBC) tem promovido uma série de encontros virtuais, por meio dos quais aproxima as comunidades dos dois países. As principais iniciativas nesse sentido foram as duas primeiras edições do Brazil-Canada Talks – que, de forma pioneira, reuniram todos os chefes de missões diplomáticas do Brasil e do Canadá para abordar o impacto trazido pelo novo coronavírus.

“A realização desses encontros em ambiente virtual tem como principal objetivo promover a troca de experiências sobre os problemas que se apresentam aos dois países nesse momento tão desafiador. Ao mesmo tempo, esta iniciativa busca viabilizar o estabelecimento de parcerias e fortalecer os canais de contato entre brasileiros e canadenses”, afirma o diretor de Relações Institucionais na Câmara, Paulo de Castro Reis.

Ele acrescenta que outras iniciativas dessa natureza deverão ser realizadas pela CCBC, a fim de preparar as empresas dos dois países a planejarem sua cooperação após a crise da pandemia passar. “Temos assistido, mesmo nesse período de incertezas, o ingresso de novos associados na CCBC. Isso demonstra uma confiança de que, superada a pandemia, teremos um cenário de cooperação Brasil-Canadá mais forte”, completa.

Discussão de alto nível

Apresentados no formato de webinars, os eventos tiveram como foco o público brasileiro (na edição em português, realizada em 6 de maio) e o canadense (na versão em inglês, em 8 de maio). Na pauta, foram discutidos temas de importância na relação Brasil-Canadá, como intercâmbio estudantil, continuidade dos negócios no cenário pós-crise e tendências de comércio exterior, além da busca por soluções conjuntas para a crise da Covid-19 –  como a possível cooperação de institutos de pesquisa nos dois países.

As duas edições do Brasil-Canada Talks tiveram a participação, do lado canadense, da embaixadora em Brasília, Jennifer May; da cônsul-geral em São Paulo, Heather Cameron; da cônsul-geral no Rio de Janeiro, Evelyne Coulombe; e da cônsul e chefe do setor comercial do Canadá no Brasil, Elise Racicot.

Do lado brasileiro, participaram o embaixador em Ottawa, Pedro Henrique Lopes Borio; a cônsul-geral em Toronto, Ana Lélia Benincá Beltrame, acompanhada do cônsul-adjunto Ademar Seabra, responsável pelo setor comercial; o cônsul-geral em Montreal, Rubens Gama; e o cônsul-geral em Vancouver, Silvio Albuquerque e Silva.

Intercâmbio comercial em alta

O intercâmbio comercial entre os dois países tem crescido de forma consistente desde 2009. Segundo informações da balança comercial, naquele ano, a corrente de comércio exterior entre Brasil e Canadá (somando-se as exportações e importações) totalizava US$ (FOB) 3,313 bilhões – volume que subiria em 51,9% no ano seguinte. Dez anos depois, em 2019, o total do comércio bilateral já atingia US$ (FOB) 5,645 bilhões – 70,4% a mais que em 2009.

Essa tendência se manteve firme no primeiro trimestre de 2020. Conforme dados do Quick Trade Facts, análise feita pela CCBC que detalha o intercâmbio entre Brasil e Canadá, houve um incremento de 7,1% na corrente de comércio exterior entre janeiro e março, na comparação com igual período de 2019 – passando de US$ (FOB) 1,25 bilhão par US$ (FOB) 1,34 bilhão. Cabe destacar a elevação das exportações brasileiras ao Canadá, que passaram de US$ (FOB) 820 milhões para US$ (FOB) 943 milhões – um incremento de 15%.

O aumento dos valores movimentados no comércio bilateral foi fortemente impactado pela elevação cambial – fator que se tornou mais relevante em março, mês que apresentou o resultado mais expressivo do trimestre. Contudo, esse mesmo fator fez com que as importações apresentassem um encolhimento de 8% no período, na comparação com os três primeiros meses de 2019.

A maior parte das vendas ao Canadá foi composta por produtos semimanufaturados (51,6%), seguidos de manufaturados (41,7%) e básicos (6,6%). Essa distribuição é bastante distinta da verificada em 2019, quando havia uma preponderância de exportações de bens manufaturados (56,4%), seguidos de semimanufaturados (29,6%) e básicos (14%).

Entre os produtos da pauta de exportações ao Brasil, vale destacar o bulhão dourado – que é o ouro em forma bruta, fundido sem ter passado por processo de refinamento ou industrialização, Entre 2019 e 2020, as vendas desse produto aumentaram 158%, passando para US$ (FOB) 278,4 milhões, o que o tornou responsável por 29,5% das receitas obtidas no período com vendas externas. Vale notar que, no contexto das incertezas trazidas pela pandemia, o ouro tem sido mais procurado por investidores interessados em proteger seu patrimônio, e a tendência de exportação desse produto deve se manter.

Novas oportunidades

As mudanças comportamentais trazidas pela crise da Covid-19 podem já ter afetado a balança comercial entre Brasil e Canadá. “Houve um aumento grande das exportações de café solúvel – o que pode ter sido impulsionado pelo fato de as pessoas pararem de tomar café na rua por conta da pandemia”, afirma a coordenadora da área de inteligência comercial da CCBC, Andréa Mansano.

De acordo com ela, setores como o farmacêutico podem contribuir para manter o intercâmbio Brasil-Canadá em um cenário pós-crise; essa tendência já se indicava no primeiro trimestre, possivelmente graças às importações brasileiras de produtos terapêuticos relacionados à cannabis medicinal. “Também observamos aumento das compras de produtos da indústria aeronáutica, em razão de parcerias que empresas canadenses mantém no Brasil, e do crescimento do mercado de aviação privada no país, com uso cada vez maior de helicópteros”, acrescenta.

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